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Gilane Santos e a educação para a luta

Confira o último material da série "Mulheres em Movimento", com a história de luta e resistência da educadora indígena Gilane Santos

28/05/2021 às 09h27

Em nosso último material da série “Mulheres em Movimento”, conhecemos Gilane Santos, indígena alagoana, do município de Palmeira dos Índios. Do povo Xukuru-Kariri, ela vive na comunidade Coité, onde moram 36 famílias aldeadas e lá atua como professora e coordenadora de ensino. E é a escola o verdadeiro espaço de luta e de vida de Gilane.

Formada em pedagogia e mãe de dois filhos, ela se descreve como uma mulher realizada.

“A história de luta da nossa comunidade é marcada desde o início por resistência e pelo sofrimento do povo e eu me sinto hoje uma mulher guerreira”, relatou Gilane.

Ao lembrar o seu período de formação no magistério e em pedagogia, inevitavelmente lembra da discriminação que enfrentou por ser uma mulher indígena.  “Já disseram na minha cara que a sala de aula não era um lugar para mim, que eu não tinha esse direito”, lembrou. Mesmo assim, Gilane seguiu seu sonho e, com o apoio da comunidade, conseguiu continuar sua formação, com o objetivo de contribuir no desenvolvimento do seu território.

“Eu enquanto mulher jovem indígena, tenho como objetivo de vida poder resgatar a cultura do nosso povo e manter viva as nossas tradições, nossa religiosidade, costumes, valores e crenças”, comentou a indígena que aos 30 anos, também integra o grupo de jovens lideranças Xukuru-Kariri que, segundo ela, tem como finalidade manter o povo em luta e em resistência.

Atuando na Escola Estadual Indígena Xukuru-Kariri Yapi Leânawan, Gilane lembra da história de luta que marca a existência do ambiente escolar na comunidade.          Hoje a escola atende 101 estudantes indígenas e não-indígenas e conta com cerca de 20 profissionais em seu quadro de funcionários.

“Desde 2010 a luta pelo acesso à educação pautou a nossa comunidade. Inicialmente utilizávamos um pequeno prédio cedido pela prefeitura e somente em 2012 conseguimos registrar a nossa escola”.

Com formação do Ensino Infantil ao 9º ano, além da modalidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA), Gilane caracteriza a educação como uma luta de resistência do povo indígena. “Ocupamos a Secretaria Estadual de Educação duas vezes. Levamos todos os estudantes, fretamos um ônibus e montamos nossa escola na frente da Secretaria para apresentar nossas demandas”.

Gilane lembrou que a última ocupação durou cerca de duas semanas. “Temos ainda hoje profissionais com contrato vencido, mas que seguem dando aula pois sabem da importância da educação em nossa comunidade, são indígenas e não vão abandonar a sala de aula. Isso é luta. Se um professor deixa a sala de aula, a Secretaria não vai mandar outro profissional e isso significa mais crianças indígenas fora da sala de aula”.

“Nós não estamos pedindo muita coisa. Queremos o básico para garantir educação de qualidade em nossa comunidade. Se a gente desistir ninguém vai lembrar de nós”, disse.

Demarcação

Mesmo com as famílias aldeadas, Gilane relata da dificuldade que as famílias vivem no território, “a gente não tem o acesso livre para ir em outras localidades, pois moramos cercados de fazendeiros e posseiros de terra. Terras essas que ainda estão dentro das áreas de demarcação”.

No processo de luta pela demarcação da terra, ela lembra ainda das inúmeras ameaças que as lideranças das comunidades sofreram e isso deixa as famílias permanentemente em alerta.

“Somos um total de 64 famílias registradas pela Fundação Nacional do Índio (FUNAI), mas só 36 estão aldeadas, pois são somente 10 tarefas de terra destinadas para nós”, disse. “Com pouca terra, onde essas famílias vão viver? Onde vão plantar?”

Gilane relata ainda das situações de que em uma única casa, pela necessidade do lugar para viver, residem três famílias. “A própria escola já precisou ser utilizada para residência de famílias. Não podemos deixar nosso povo vivendo abaixo de árvores”.

A Pandemia

“Nossa principal fonte de renda é a agricultura familiar e os programas sociais que algumas famílias têm acesso”, explicou Gilane.

Mesmo durante o período de agravamento da Pandemia da Covid-19, ela relata que a comunidade seguiu intensificando o trabalho com a terra, na produção de alimentos, mas as vendas nas feiras livres da cidade foram reduzidas. “Com a diminuição das vendas, até a nossa ida às feiras ficou comprometida, pois precisamos de recurso para levar nossa produção e não temos nenhuma política de comercialização do que é produzido em nossas terras”.

“A gente tem plantado para sobreviver. Trabalhamos muito também com o artesanato, mas do mesmo jeito, não temos possibilidade de vendas no período da Pandemia”.

Gilane destacou ainda que chegou a fazer uma campanha de arrecadação financeira nas redes sociais para ajudar na sobrevivência das famílias da comunidade. “E a gente nunca vai parar. Vamos continuar lutando e resistindo para sobreviver e manter viva nossa cultura”.

Saúde e Assistência

No que diz respeito às políticas públicas de saúde, Gilane destaca a assistência da Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI) no município que atua diretamente com a população aldeada de Palmeira dos Índios, contando com indígenas na maioria do seu quadro profissional.

Na política de Assistência Social, ela relata ainda a ausência de profissionais para atendimento à comunidade, bem como a ausência de políticas públicas direcionadas ao público indígena.

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