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Instâncias de controle social e os desafios para a atuação profissional: CRESS Alagoas entrevista Valéria Correia

Confira entrevista com a professora da Faculdade de Serviço Social da Universidade Federal de Alagoas (FSSO/UFAL) e Coordenadora do Grupo de Pesquisas e Extensão em Políticas Públicas, Controle Social e Movimentos Sociais, Valéria Correia

05/10/2021 às 12h12

Com a pandemia da Covid-19 uma série de limites têm sido vivenciados pelo conjunto da população, afetando diretamente o cotidiano da classe trabalhadora nos mais diversos aspectos do dia-a-dia. O resultado desse momento impôs dificuldades, por exemplo, no acesso da população aos diversos serviços públicos.

Pensar esse cenário é também refletir sobre o papel das instâncias de controle social, que reafirmam sua importância na defesa e construção de políticas públicas que atendam às demandas da população usuária dos serviços sociais.

Dialogando sobre esses limites colocados para a atuação das instâncias de controle social, bem como nas demandas presentes para a atuação da/o assistente social nesses espaços, o CRESS Alagoas entrevista Valéria Correia, professora da Faculdade de Serviço Social da Universidade Federal de Alagoas (FSSO/UFAL) e Coordenadora do Grupo de Pesquisas e Extensão em Políticas Públicas, Controle Social e Movimentos Sociais.

“É necessário compreender que esses espaços expressam as contradições de interesses de classe existentes no conjunto da sociedade. Cada pauta, cada decisão, cada posição pode representar o fortalecimento das políticas sociais ou o seu desmonte”, ressaltou a professora em trecho da entrevista.

Confira na íntegra:

O período de pandemia impôs uma série de mudanças e adequações em nosso cotidiano profissional, bem como no acesso da população aos diversos serviços públicos. De que maneira esse contexto afetou as instâncias de controle social?

As mudanças provocadas pela pandemia aprofundaram o distanciamento já existente entre as instâncias de controle social e a população usuária dos serviços públicos. As reuniões dos Conselhos de Direitos - Saúde, Assistência, Criança e Adolescente, Idoso, Educação, entre outros, passaram a ser virtuais, quando ocorrem, e, embora as condições de vida da maioria da população tenham piorado, o protagonismo dos Conselhos tem sido arrefecido. A dificuldade de articulação causada pelas restrições impostas pela pandemia pode ter agravado esse quadro, mas outras determinações estão envolvidas.

Ressalto, por exemplo, a necessidade de rearticular os Conselhos Gestores das Unidades Básicas de Saúde de Maceió, pois, antes mesmo da pandemia, muitos já não estavam funcionando e a Atenção Básica de Saúde vem sendo desmontada.

A pandemia evidenciou a importância do conceito amplo de saúde, como resultado de condições de vida e de trabalho. Os Conselhos locais de saúde têm um papel relevante nesse sentido, não só em reivindicar o acesso aos serviços de saúde da população em todos os níveis de atenção, mas, também de exigir melhores condições de vida como alimentação saudável, saneamento básico, moradia digna, escola, creche, transporte público, áreas de lazer etc.

Reativar esses Conselhos e articulá-los entre si e com os demais conselhos municipal e estadual de saúde e com os das outras áreas sociais seria uma estratégia importante para enfrentar de forma coletiva os problemas sociais, especialmente, nesse período de pandemia. Entretanto, ressalto que, como já venho afirmando há anos, só existe controle social de fato, se houver controle sobre o fundo público das políticas sociais, sobre quanto chega e para onde vai, exercendo o caráter deliberativo dos Conselhos sobre a execução financeira das políticas sociais.

Para além dos limites colocados pela pandemia da Covid-19, vivemos hoje no país um contexto de desmonte das políticas sociais que afetam diretamente a classe trabalhadora e seus territórios, como você avalia esse cenário? Quais são os principais desafios para os trabalhadores e trabalhadoras na defesa desses direitos no atual contexto?

O desmonte das políticas sociais ocorrido no governo ilegítimo Temer, a partir das Emendas Constitucionais 93 e 95, provocou sua asfixia financeira, desfinanciando-as, e, consequentemente, desestruturando-as. O ajuste estrutural no Brasil passou a ser constitucional, virou lei. O corte de gastos sociais para o proporcionar o pagamento da dívida pública e amortecer os seus juros e alimentar a financeirização do capital foi garantido, gerando mais desemprego, fome, aumento da pobreza e da desigualdade social.

O governo Bolsonaro foi a aposta da classe dominante para continuar o seu projeto “liberal na economia e conservador nos costumes”. Seu governo de ultradireita e ultraneoliberal tem provocado a devastação dos direitos sociais, do meio ambiente, dos povos originários; o aumento da violência contra negras/os, mulheres, pobres e LGBTQIA+; e o aumento da fome, da carestia, do desemprego. 

O maior desafio, neste momento, para a classe trabalhadora enfrentar essa realidade, é tirar o presidente e seu vice, exigindo impeachment já, ocupar as ruas, com muito cuidado, pois a pandemia não acabou, e fazer pressão no parlamento são caminhos para isso.

Os espaços de controle social compreendem um importante papel na garantia, defesa e construção de políticas públicas que atendam às necessidades e anseios da população usuária dos serviços sociais. Qual o papel do/a profissional Assistente Social nesses espaços?

A/o assistente social tem sido demandado à intervir nos espaços de controle social - Conselhos e Conferências, seja na criação e mobilização da população para participar desses espaços, seja na organização, funcionamento dos Conselhos ou na formação e capacitação de conselheiros. Algumas/uns atuam como assessoras/es e/ou integrantes da equipe técnica.

É necessário compreender que esses espaços expressam as contradições de interesses de classe existentes no conjunto da sociedade. Cada pauta, cada decisão, cada posição pode representar o fortalecimento das políticas sociais como pública, estatal e direito universal; ou o seu desmonte, terceirização, privatização, subfinanciamento, focalização, benesse.

A/o assistente social, coerente com seu projeto ético-político, deve atuar nesses espaços na direção da defesa dos direitos das classes subalternizadas, trazendo informações sobre os dados de realidade do contexto geral e particular do município ou do estado, sobre o fundo público destinado a tal política social, subsidiando a atuação crítica em defesa dos direitos sociais dos conselheiros e usuários. A dimensão pedagógica do trabalho profissional é crucial nesse âmbito de atuação.

Fortalecer os movimentos sociais, ter vínculos com eles e estimular o controle social sobre o Fundo Público são compromissos profissionais importantes para contribuir com a efetivação dos direitos sociais.

Olhando para Alagoas, quais têm sido os avanços e contribuições do Serviço Social nos espaços de controle social?

Em Alagoas, as/os assistentes sociais têm contribuído no acompanhamento dos Conselhos e organização das Conferências das várias áreas das políticas sociais, especialmente, na Saúde, Assistência e nos seus segmentos – Criança e Adolescente, Idoso e Pessoa com Deficiência. Mas, encontram muitas dificuldades, desde a cultura de poder coronelista, nos municípios, avessa à participação social e à transparência no uso dos recursos públicos, até a baixa cultura de organização e mobilização dos segmentos subalternizados da sociedade.

Essas contradições, somadas à realidade de extrema desigualdade social que resulta em - fome, déficit de moradia, de morosidade na reforma agrária e falta de incentivo à agricultura familiar, de baixos índices de saúde, educação e IDHM, de alto índice de violência, feminicídio, LGBTfobia e de racismo – expressa a importância da inserção profissional nesses espaços.

O controle social pode se tornar um mecanismo de garantir direitos. Mas, ressalto que se faz necessário que as/os assistentes sociais criem ou mantenham vínculos com os movimentos sociais, as lutas são coletivas e não individuais.

Por fim, lembro que, em Alagoas, existe o Conselho do Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza (Fecoep) que as/os profissionais junto com os movimentos sociais precisam conhecer, questionar e ocupar esse espaço, exigindo um plano estadual que atenda às reais necessidades da população empobrecida.

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